sexta-feira, 1 de outubro de 2010

A Caça Submarina / Os Açores



Como começou esta paixão pelo Fundo do Mar.
Foi por volta de 1988 que me iniciei na Caça Submarina, também na Zona do Espichel e Sesimbra.
Recordo-me das imagens dos cardumes que via de cima das falésias onde pescávamos, na altura apanhava à cana: Salemas, Bogas, Tainhas e Garrentos, Cavalas e Carapaus, Sargos e Peixes Porco, Peixe Agulha e outras tantas espécies.
Lembro me também dos aparelhos que o meu pai fazia para o polvo, em rede, com uma meia de vidro lá dentro, com carapau ou peixe espada.
A minha curiosidade chamava por mim, o que eram aqueles vultos que eu via lá em baixo.
Recordo que numa das pescarias no Espichel, levei a espingarda de caça submarina, que na altura tinha sido dada por um amigo e estava em cima das rochas, a dar tiros para dentro de agua a ver se acertava nos cardumes que por ali passavam. Nem um peixe apanhei, assim que o arpão entrava dentro de agua a sua trajectória era de imediato alterada."Ai que vontade tenho de ir ai para dentro ter com vocês.... pensei para comigo."
Nesse mesmo dia, após virmos da pesca fui ter com um amigo a casa dos seus Avós, para ir buscar emprestado um fato de mergulho, era do tio e só o utilizou salvo erro em Inglaterra em aguas mais frias, era um fato de 0.9 mm, bem como um cinto de chumbos com 3 Kg.
Já estava, barbatanas arma e óculos já tinha, fato e cinto chumbos emprestados da próxima eles iam ver.
E finalmente aconteceu, o fundo do mar no Cabo Espichel é magnifico, algo que não nos esquecemos facilmente, grande flora e grande fauna. O 1º impacto foi algo de extraordinário mas o fato de 0.9 mm tinha pouca mobilidade chegando ate a ficar com calor, também tinha muita dificuldade em mergulhar só tinha 3 Kg de chumbo e com um fato daquela espessura não à barbatana que nos leve para baixo.Neste 1º mergulho, quase no momento que estava para sair, reparei que na parede da rocha onde entrava e saia estava um polvo e vendo melhor ao meu redor estavam mais dois relativamente perto, la apanhei os 3 à mão, sem arma pois já agarrava neles sem problemas, por causa dos aparelhos do meu pai aquando a Pesca à Cana e lá foram eles um a um para dentro do saco de rede. Recordo a expressão de alegria do meu amigo David Coelho, que na altura estava a acompanhar-me de cima das rochas, em menos de cinco minutos viu-me a apanhar 3 Polvos.
Fiquei maravilhado da forma como os Polvos se camuflavam, se-calhar já ali estavam aquando a minha entrada e nem reparei neles, havia tanto para aprender.
Depois foi Setúbal e Sesimbra, dos Pés de Galo no molhe exterior até quase à zona da Azoia, tudo foi minimamente explorado e experimentado.
A Caça Submarina exige uma pratica constante a fim manter uma boa apneia e tal não era possível com essa regularidade porque na altura vivia em Lisboa e o único meio de transporte era uma Yamaha XT 600 do meu amigo Nuno (Fobias), com quem comecei a partilhar os momentos de Caça Sub.
Ainda me lembro de uma das viagens de regresso a casa de moto com todo o material chegarmos a meio caminho e sentir-mos um cheiro a queimado, era o fato novo do Nuno a queimar no tubo de escape da XT 600 depois de derreter a mala que o transportava.
Mas o que não fazíamos para fazer uma caçada, estão a imaginar o que é levar material para fazer caça Submarina para duas pessoas numa moto de Lisboa a Setúbal ou Sesimbra, mas a vontade era tanta que la se arranjava maneira de caber tudo e mais alguma coisa.
Lembro-me que pouco tempo depois comecei a ir à noite, na altura ainda não havia legislação que não o permitisse fazer.
E que experiência também inesquecível, recordo que quando o fiz pela 1ª vez fiquei eufórico é algo indescritível a meu ver, um silencio absoluto apenas o foco da lanterna a iluminar e quando a desligamos vemos bolhas quase verdes fluorescentes que percorrem o nosso corpo e todos os organismos à nossa volta, quem já o fez sabe certamente ao que me refiro, uma visão de maravilhar qualquer um.
Nessa altura já tinha carro, ia para Santana para casa de um irmão de um amigo, ambos praticavam Caça Submarina de noite na zona de Sesimbra e foi com eles que comecei as caçadas à noite.
Era chegar a casa deles, molhar o corpo na banheira com agua quente para vestir os fatos que na altura já eram os especiais caça, preparar e verificar o restante material, toalhas para cima dos bancos do carro e arrancar para Sesimbra onde assim que chegávamos quer da praia, quer do molhe exterior, (Pés de Galo) era logo para dentro de agua.
Foi em Sesimbra que comecei a conhecer algumas espécies novas para mim em termos de capturas, a Solha da Pedra, a Abrótea, o Lírio, a Santola e o Cavaco, o Choco, o Safio, o Robalo, o Pargo etc...
Lembro-me de uma noite perto da praia dos coelhos em Setúbal, onde numa pedra pequena estavam oito boas Santolas, bem como os Cavacos pequenos, que eram às dezenas nos Pés de Galo.
Foram experiências muito gratificantes das quais gostava de ter fotos para poder recordar algumas capturas, mas infelizmente não tenho, como o 1º Pargo em Sesimbra o primeiro peixe que deu para 4 pessoas no forno, ou o 1º Robalo, são aqueles momentos que todos gostaríamos de ter fotografado para mais tarde recordar.





Mas sentia que algo faltava, então uns anos depois e após umas poupanças lá vieram os Açores pela 1ª vez.
Para começar bem esta viagem, recebi como prenda, "oferta da minha mulher" uma arma nova, "uma Picasso de 1m em carbono" oferta do nosso 1º ano de ajuntamento como lhe chamamos, dia 03-06-2001 uma data especial, ainda hoje vivida com esta minha pequenina Grande Mulher.
Era um sonho tornado realidade e nada podia falhar. Não é todos os dias que se consegue juntar 4 amigos o Gonçalo o Nuno, o Pedro Loiro e eu, para fazer tal digressão à Ilha de São Jorge ficando 15 dias de ferias.

Na altura só conhecia os mares dos Açores pela revista Mundo Submerso e pelos relatos do meu amigo Gonçalo, que já lá teria estado e dito maravilhas daqueles mares e daquelas gentes, depois aquele verde imenso um verdadeiro Paraíso Perdido, como lhe apelidaram na altura numa reportagem que vi posteriormente na RTP 2.
Lá, vim a saber que era o único sitio das ilhas dos Açores onde se reproduziam Ameijoas, a Fajã da Caldeira de Santo Cristo.Um local inacessível para um carro, um caminho de cabras de quase 7 Kms percorridos a pé com uma mala de Campismo com mais de 35 Kg. Mas valia a pena, era para poder chegar ao paraíso. 




Os romeiros.
Era aqui que ficávamos, nos romeiros, aquela casinha comprida por baixo da igreja.
Os romeiros, eram a casa de passagem de muita gente, em especial daqueles que nas romarias faziam grandes caminhadas e ali descansavam, recordo-me que para obter a chave, teríamos de ter autorização do padre por escrito e depois havia um dos poucos habitantes da Fajã, que lia a mensagem do padre e nos dava as chaves.



A nossa vista de manha ao acordar, bonita não?

Penso que esta foi a 1ª pescaria no lado sul da ilha.
A nossa cara de felicidade, mesmo sem apanhar nenhum peixe de bom porte. Estávamos mesmo felizes, de poder estar ali juntos a desfrutar aqueles momentos.


















As Vegas, que os Açorianos tanto apreciam.
Mais tarde vi o que lhes faziam, eram secas ao sol cerca de 3 dias e depois directamente para bidões de 250 litros acamadas umas em cima das outras e cheias de sal.
Um verdadeiro Bacalhau, ficando eu na altura admirado com o seu sabor, eles lá sabiam o porque de as preferirem aos outros peixes.









Bem, a experiência dos Açores foi mais uma para a historia, aqueles 15 dias, uma vida de nómada em que pescávamos para comer e para oferecer o peixe que apanhávamos, adorei conhecer aquele imenso mar azul, as espécies novas em termos de capturas, "a Moreia, o Moreão, o Mero, a Garoupa, o Enchareu, a Anchova, a Barracuda", as Fajas, as artes de pesca que falarei mais à frente e aquelas pessoas que são de uma simplicidade e simpatia que me deixaram sem palavras.
Depois lá veio a 2ª vez, desta vez com a minha mulher e os meus amigos João Fonseca e Gonçalo.
Desta vez nem pescamos no lado Sul, fomos direitinhos para a Caldeira de Santo Cristo, local que já falei atrás, mas já não seriamos nós a carregar o material, mas sim a moto 4 que podem ver nas fotos abaixo.












 

Os romeiros local onde ficamos a dormir tal como da 1ª vez que la estivemos, na Fajã da Caldeira de Santo Cristo.   

Lamentavelmente não tenho fotos das pescarias. Também o tempo não permitiu fazer as mesmas jornadas que fizemos uns anos antes. Desta vez, a maioria das fotos foram tiradas já em formato digital e arderam uns anos depois, quando tive de formatar o pc, ou talvez ainda as encontre nas dezenas de dvds que tenho com backups, a ver vamos.
Mas felizmente, houve outras, tiradas na maquina de rolo, que já digitalizei e consegui assim recordar outros momentos que vos irei falar de seguida.


                                                                       A Tarrafa

Pois ora ai está, uma técnica que não conhecia e vi ao vivo pela 1ª vez nos Açores, a Tarrafa.
"a foto de cima e só ilustrativa para a arte de pesca"

Posso vos dizer que neste dia o mar estava bravo, o tempo para o chuvoso e ventoso, sem condições para a Caça Sub, mas o amigo Moisés Reis, em menos de meia hora arranjou logo petisco, meio balde de peixinhos para a fritadela, eram Sarguetas e Tainhas na maioria, apanhados dentro da lagoa.
Como me impressionou quando o vi lançar pela 1ª vez a rede e quando a puxa vinha com mais de 10 peixes.






























Nesta lagoa, habitavam Sargos e Pargos com mais de 2 Kg, os quais entravam pequenos, ficavam por ali e depois já não conseguiam sair.
Os Meros pequenos eram às dezenas, imagino que os grandes também estariam por lá, mas mais bem escondidos. A visibilidade na lagoa era muito pouca, cerca de 1,5 m.
No Pontão desta lagoa, "foto abaixo" onde amanhava o peixe, dei uma vez de comer a duas moreias, que colocavam a cabeça fora de agua, para apanhar as tripas dos peixes que estava a arranjar e as quais usava para brincar com elas. Hoje em dia, imagino o que se poderia fazer ali com uma cana e material adequado.
Muito brincámos nós na Lagoa, ao final do dia, com as canas de bambu e um pouco de linha e anzóis pequenos que tinha levado, com bocados de esferovite ou cortiça a fazer de bóias.








Uma Caçada às Cabras Selvagens.

Que Aventura, a minha 1ª ida à caça, com o Moisés Reis e o seu irmão José Reis, com os seus Cães de Caça, bem como o Gonçalo e o João Fonseca.
A caminhada era longa, teríamos de passar o fim da montanha que vêm na  1ª foto com a maré baixa, doutra forma era difícil passar para o outro lado e lembro-me que esta foto deve ter sido tirada por volta da 5 e meia da manha, logo com uma aguardente no bucho como pequeno almoço, para poder aquecer uma vez que o caminho a percorrer era longo.

As cabras teriam fugido aquando o grande terramoto de 1980 e procriado nas montanhas, chegando a ser uma praga. Apareciam de vez em quando nas falésias e mais perto da costa.
Recordo-me no dia anterior a esta aventura, o Moisés estar a apontar para as montanhas e dizer que estavam lá dezenas de Cabras. Eu sinceramente só de binóculos as consegui ver. É de facto impressionante as experiências vividas com estas pessoas, a forma como nos transmitem os seus conhecimentos sendo que alguns deles passaram de gerações em gerações.




Apanhamos sete cabras ao todo, foi uma experiência inesquecível, recordo-me de irmos pelo calhau costa fora e de repente as cabras começarem a aparecer, os tiros de caçadeira faziam eco naquelas falésias e o ladrar dos cães de caça que se agarravam as cabras numa luta sem tréguas ate que os donos as agarrassem e prendessem.




O Leão, à esquerda e a Pulga à direita. O descanso dos Guerreiros.
Apanharam 3 cabras vivas, uma delas, a que está na foto que se segue.                                                                                                                                                             


Continuo a preferir a pesca, mas acho que é algo que deve ser  recordado, que cenário diferente daqueles que tinha vivido até agora, mais uma para o álbum de recordações.


Um brinde, com a celebre aguardente de Amora, uma verdadeira delicia daquelas terras, e por falar em terra,  aproveitando que estamos a sair do tema principal, que é o Mar e a Pesca, aqui ficam umas fotos da apanha da batata e de como o Moisés Reis ensinava os cães de fila Açorianos a não ter medo das cabras, estas ainda referentes a 1ª viagem aos Açores.





Assim, dou como encerrado este capitulo dos Açores, muito ficou por dizer e mostrar, mas não posso deixar de dedicar esta parte dos Açores, ao Grande Sr. Moisés Reis, a quem estou abraçado na foto acima juntamente com o Gonçalo. Um verdadeiro Mestre em tantos ofícios, sendo um deles a Pesca.
Infelizmente, também já não está entre nós. Não sei como partiu, mas sei, que me quero recordar dele como sempre o vi, uma pessoa simples e humilde, que nos recebia em sua casa como se fossemos parte da sua família e que tudo fazia para que aproveitássemos ao máximo a nossa estadia, proporcionando-nos momentos tão agradáveis.
Obrigado Moisés.












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